segunda-feira, 26 de novembro de 2012

FARDO LEVE


Só um leitor de Nietzsche seria capaz de escrever versos como estes. Embora não tenham sido inspirados em nenhuma obra específica do pensador alemão, é inegável a influência de seu pensamento. Este poema foi escrito em 2008 quando “Aurora”, “A Gaia Ciência” e “Além do Bem e do Mal” me acompanhavam para todo lugar.

Não é a vida
Que é dura demais
São as nossas idas e vindas
Que nos fazem andar para trás

Às vezes, corremos em círculo
Atrás de ninharias
Por causa de desejos minúsculos
Fazendo da vida uma porcaria

Não é a vida
Que nos é injusta
São nossas ações
Que a ela não se ajustam

Às vezes, tentamos satisfazer
Os desejos mais banais
E esquecemos que viver
Exige sacrifícios reais

Não é a vida
Que é um fardo pesado
É o excesso de ninharias
Que temos carregado

Deixe esse peso para trás
E leve só o que te serve
E então verás
Que a vida é um fardo leve

terça-feira, 6 de novembro de 2012

ADEUS À INOCÊNCIA - CAP. 32

A noite caiu rápido. E antes que ficasse escuro de vez, Marcela e Luciana foram recolher mais galhos para manter a fogueira acesa. Eu fiquei na cabana em companhia de Ana Paula, com a desculpa de que alguém precisava tomar conta do fogo para que este não apagasse.
-- O que aconteceu lá em cima? -- quis saber minha prima.
-- Por quê? -- perguntei surpreso.
-- Você chegou meio estranho.
-- Estranho como?
Apanhei um graveto e comecei a mexer no fogo tentando ocultar o embaraço que aquela pergunta me causava. “Será que estou mesmo?”, cheguei a perguntar-me. Ana Paula por sua vez mantinha-se próxima, quase a meu lado, sentada sobre a areia com as pernas cruzadas.
-- Aquela vadia não para de olhar para você. E você não olhou para ela uma única vez. Parece que está com medo de olhar para ela – observou. Eu poderia imaginar que Luciana não tirava os olhos de mim. No entanto, Ana Paula estava certa. Estava envergonhado demais para poder encará-la. Embora Luciana tenha encarado tudo com naturalidade, para mim não era tão simples assim. Era como se eu tivesse acabado de cometer um crime. -- O que ela te fez?
-- Nada.
-- Vocês não andaram...
-- Andaram o quê? – atalhei.
-- Nada. Deixa pra lá – disse ela, levantando-se e caminhando em direção à praia. -- Vou tomar um banho. Estou toda suja de areia.
Senti um certo alívio quando ela me deixou as sós. Imediatamente pensei: “Se ela desconfiou da gente então a Marcela também deve ter percebido. Ela sabe o que a gente fez. Ah, meu deus! E agora? E se a Luciana fala alguma coisa pra ela? Ela nunca mais vai querer saber de mim. Vai me odiar. Também por que fui deixar a Luciana fazer aquilo? Não tinha que ter dados ouvidos para ela. Ela conseguiu o queria. Só falta agora não me deixar mais em paz. Vi como ela gostou...”.
Momentos depois as duas retornaram. Cada uma trazia um feixe de galhos secos. Conversavam alegremente e nada me levava a crer que Luciana contara sobre nós. E quando Marcela me depositou seu olhar, este parecia natural, tranquilo, igual ao último que me dera cerca de meia hora antes.
-- Cadê a Ana Paula? -- perguntou, com um ar de indiferença.
-- Disse que ia se lavar.
Luciana jogou a lenha ao chão, próximo à fogueira que ardia branda, meio que querendo apagar por falta do que queimar; Marcela pegou seu feixe de gravetos e os atirou no mesmo lugar, amontoando-os.
-- Vou ver se acho ela – disse em seguida. E saiu.
As sós com Luciana, só então tive coragem de olhar nos seus olhos. Ela me encarou com um sorriso extrovertido, beirando uma gargalhada e indagou:
-- O que foi? Ainda está envergonhadinho?
Desconsertado, respondi:
-- Não. Não estou. Só fiquei com medo de você contar para a Marcela.
-- Por quê? Ela não pode saber? -- volveu ela, aproximando-se de mim.
-- Não, melhor não.
Dei dois passos para trás até encontrar uma das quatro colunas de sustentação da cabana. Luciana achegou-se e por cima da roupa, pegando em minha genitália, sussurrou-me ao pé do ouvido:
-- Agora isso aqui é só meu. Se eu souber que você andou se deitando com uma das duas você vai ver o que vou fazer com elas.
Era a primeira vez que a via fazer ameaças. E pelo tom de voz, pela pressão de seus dedos, suas ameaças soavam sérias. E isso me deixou assustado; mais assustado do que ficara ao ouvir aquele som vindo da floresta dois dias atrás.
Ciúmes? Estaria Luciana com ciúmes das outras duas? Ou apenas queria manter o controle sobre mim? Pois ela sabia que eu estava em suas mãos e que a obedeceria sem muito protestar. E sem saber como reagir, com sair daquela situação embaraçosa, apenas assenti:
-- Tá bom.
Houve um breve silêncio.
Nisso, Luciana se afastou e foi até a porta ver se Ana Paula e Marcela retornavam. Contudo, ouvia-se as vozes ao longe. Provavelmente ainda estavam se banhando. Não era possível vê-las àquela distância, pois anoitecera. Uma nuvem escura cobria a lua deixando ainda menor o nosso ângulo de visão.
Em seguida, voltou a se aproximar de mim, abraçou-me e beijou-se, como se eu fosse seu namorado. Tentei esquivar, mas ela me abraçava com força, como se quisesse deixar bem claro que poderia fazer comigo o que bem quisesse.
-- Você agora só sai por aí comigo – disse depois de me lagar.
Eu não disse palavra. Apenas me afastei e agachei próximo à fogueira para colocar um pouco mais de lenha para manter o fogo aceso. Nisso, ouvi a risada próxima de Ana Paula. No mínimo estavam falando algo engraçado.