terça-feira, 24 de novembro de 2009

A MENINA DO ÔNIBUS - Capítulo I/3

Mentira-lhe e agora teria que arrumar alguma coisa para comprar. Mas o quê? Não tinha noção do que lhe presentear. Sabia ser necessário algo que a encantasse, a deslumbrasse, tocasse-lhe à alma e provocasse-lhe as mais diversas emoções. Precisava ser algo que a cegasse diante da nossa diferença de idade – embora ainda não fizesse ideia de sua idade, suspeitava que fosse mais nova do que pensara antes – e ao mesmo tempo abrisse seus olhos para mim. O problema era: o que poderia causar-lhe tal efeito? “Um perfume! Não, não causaria o impacto de que preciso. Funcionou com a Tatiana, mas com a Mônica não deu muito cero. Vi a cara que ela fez. Decepção. Cara de quem não gostou. Foi difícil contornar. Um erro. Devia ter notado que ela não usava perfume. E Ana Carla? Será que usa? A maioria das jovens gostam de se perfumar. Atraem pelo cheiro. Mas ainda não a vi usando. Melhor não arriscar. Melhor pensar noutra coisa...”, disse para mim mesmo.
Quase não dormi com essa dúvida na cabeça. Lá pelas tantas da madrugada finalmente cheguei a uma conclusão: haveria que ser algo discreto e ao mesmo tempo belo, algo que ela não haveria de ter, mas que toda mulher se sentisse seduzida ao recebê-lo, e principalmente algo que ela poderia levar para qualquer lugar, onde quisesse, pois dessa forma a imagem do objeto a faria lembrar-se de mim. Assim, resolvi comprar-lhe uma pulseira de ouro.
Aproveitei o intervalo do almoço no dia seguinte para tentar encontrar uma que fosse a cara dela, uma pulseira que a seduzisse de tal forma a cegá-la para todos os meus defeitos e ao mesmo tempo a deixasse tão vulnerável às minhas investidas que eu não encontraria resistência, por mais que fosse uma jovem de pudor. Passei no banco, retirei dinheiro no caixa eletrônico e fui à Santos. Embora houvessem uma ou outra relojoaria no Guarujá, tinha em mente que em Santos encontraria uma maior variedade de modelos, peças mais sofisticadas e preço mais em conta.
Talvez o leitor se pergunte: mas para que tanto trabalho? Quando se trata de um presente – e ainda mais de uma joia – o presenteado não vai se importar se é uma peça mais sofisticada ou menos; até porque no caso da Ana Carla, ela não saberia fazer essa distinção. O leitor provavelmente terá toda a razão. Eu sabia perfeitamente que Ana Carla se contentaria com uma pulseira simples. A questão não era ela e sim eu. A um homem de gosto refinado não se pode permitir a compra de uma peça qualquer, algo vulgar. É como pagar por uma pintura barata, de um artista sem talento e pendurá-la na parede do escritório apenas para agradar aos olhos dos visitantes, ciente de que não saberão distinguir uma obra de arte. Mas quando se sabe distingui-la, o tosco incomoda as vistas. Como poderia olhar para Ana Carla, para seu braço e ver uma joiazinha qualquer? Não, de forma alguma! A uma peça rara outra igual.
Com muito custo, depois de muito olhar e ponderar, acabei encontrando-a. Tratava-se de um exemplar encantador, uma pulseira bem fininha, com detalhes trabalhados. Aliás, eram esses detalhes que a torava especial. Comprei-a. E aproveitei que estava ali e comprei roupas novas – embora meu guarda-roupa estivesse repleto de camisas, calças, meias e sapatos usados uma ou duas vezes -- para me encontrar com ela. Queria que tudo fosse novo.
Voltei à empresa. Ainda havia uma reunião com dois clientes acerca de investimentos para automação de uma rede varejista que estava expandindo suas atividades no Guarujá. Embora não fosse o responsável pelo contrato da firma, era quem deveria decidir quais os melhores equipamentos e software para suprir-lhe as necessidades.
Ana Carla me ligou por volta de dezesseis horas. Disse-lhe que não lhe poderia falar naquele instante, mas lhe comprara o presente. Aliás, adiantei-lhe isto apenas com o intuito de aguçar-lhe a curiosidade. Sabia de antemão que qualquer pessoa, principalmente uma jovem feito ela, ficaria morrendo de vontade em saber o que havia lhe comprado, pois é nessa idade onde nos sentimos mais curiosos, mais ávidos por respostas as nossas indagações. Até porque a curiosidade é algo que faz parte de qualquer animal, princialmente do ser humano. E é justamente esse impulso quem na mais das vezes leva às grades descobertas, descobertas essas capazes de mudar mundo. E foi justamente a curiosidade que a levou a perguntar:
-- O que que você comprou?
-- É surpresa. Não posso falar.
Ela insistiu, mas eu disse que não falaria nem sob tortura. Então lhe pedi para me ligar por volta de dezessete horas, quando eu estaria livre, para combinarmos como e onde lho entregar.
Mais uma artimanha. Queria ver se me telefonaria no horário combinado. Se o fizesse, era mais um indicativo de estar no caminho certo.
Ah, amigo leitor! Não penses que não aguardei seu telefonema ansiosamente; aliás, de uma forma um tanto fora do comum. Tenho de admitir que meu desempenho no trabalho fora afetado. Houve um desprendimento, uma falta de concentração que não passou despercebido aos colegas de trabalho. Houve inclusive uma pergunta: se estava tudo bem comigo, se não estava com algum problema, a qual respondi de forma lacônica, mas dando a entender não ter nada de errado. E, embora a hora me tenha dificultado as coisas, finalmente o momento chegou.
Ligou-me prontamente no horário. Conversamos por alguns minutos. Sugeri nos encontrarmos numa praça ali perto de sua casa ao invés da esquina como havia proposto. Ela concordou. Perguntei se não haveria problema de sair sozinha.
-- Não, claro que não. Falo para minha mãe que vou na casa da Marcela.
Então, marcamos o encontro para dezoito horas.
Foi um encontro extremamente produtivo. Eu estava tão bem vestido e perfumado como nunca estivera em toda a minha vida. Bem talvez isso seja um exagero, pois toda vez em que ia a um novo encontro estava impecavelmente vestido, de forma que estar “tão bem vestido e perfumado como nunca” fosse uma impressão de momento. Ela também se produzira para a ocasião. Usava uma mini-blusa decotada branca e uma minissaia jeans. Aliás, como tantas de sua idade, sentem prazer em mostrar as pernas e ao mesmo tempo ocultar o que há acima delas, como se dissessem inconscientemente: “Veja isso! Se isso é bom, imaginem o que não podem ver!”. E assim são capazes de seduzir o mais inseduzível dos homens. Quando lhe dei três beijinhos na face, percebi o quanto ela estava cheirosa. "Ela se arrumou para mim...", conclui. E como não chegar a tal conclusão? Todas não fazem isso? E, apesar de não se tratar de um encontro amoroso, era evidente que tencionava causar-me boa impressão; talvez para não se parecer uma qualquer, pois haveria de saber que aquele rapaz era alguém cujo mundo não tinha nada com o seu.
Ela estava ansiosíssima em saber qual era a surpresa, pois mal disse um “oi” e já foi perguntando por ela. Poderia ter mantido o suspense por mais alguns instantes e agido com uma certa perversidade, todavia não queria deixá-la naquele estado, por isso levei a mão ao bolso e retirei a pequena caixa envolta num papel prateado, sobre o qual cruzava um laço e uma pequena rosa vermelha, e entreguei-lhe a joia. Aliás, diga-se de passagem, também eu era consumido pela curiosidade, pelo desejo de saber como ela reagiria, qual lhe seria a expressão da face, o movimento das mãos, o som que fatalmente deixaria escapar de seus lábios vermelhos, o brilho de seus negros olhos. Vi o quanto ficou encantada e admirada com o presente. Seus olhos brilhavam intensamente e, apesar do meu estado de afetação, percebi que ela também ficara afetada, embaraçada e meio que sem saber como agir. Não restava a menor dúvida de que eu lhe causara a melhor das impressões.
Ah, querido leitor! Talvez você ainda não tenha percebido, mas são nesses instantes, nos instantes de extrema felicidade ou dor, onde as pessoas ficam mais vulneráveis. Nesses momentos, a pessoa está num estado em que seu cérebro não consegue enxergar o perigo diante dos olhos; pois a absorção faz com que este pareça coisa distante. Sabendo disso, eu dei o passo decisivo para conquistá-la.
Primeiro, perguntei-lhe se poderia colocar-lhe a pulseira. Sabia que concordaria. Que mulher negaria um pedido desses? Ela estendeu o braço e a coloquei. Em seguida peguei em sua mão e lhe perguntei se havia ficado bonito. Deslumbrada por uma onda de alegria, com um sorriso a ir dum canto a outro, respondeu:
-- Lindo, adorei!
-- E com ela você ficou ainda mais bonita – arrisquei.
Ana Carla deixou escapar outro sorriso, embora um tanto comedido.
-- E eu, não mereço um abraço por isso?
Meneando a cabeça, ela abriu os braços. Tomei-a nos braços e foi um abraço apertado e maravilhoso. Enquanto a abraçava, beijei-lhe a face e o pescoço, afaguei seus cabelos e alisei cuidadosamente, de forma bem leve e suave, com as pontas dos dedos, sua nuca. Disse-lhe também que me sentia muito feliz em estar recebendo todo aquele carinho. E sabe o que ela me respondeu?
-- Eu também.
Era tudo que eu necessitava ouvir para pensar nos próximos passos. Não restavam dúvidas. Como todas as outras, por falta de experiência, caíra na armadilha. Custou-me mais e deu-me mais trabalho, entretanto quanto mais trabalhoso a busca, maior a recompensa, diz o ditado popular.
Senti-la em meus braços me causou uma grande exaltação; quase não me contive. Não foi nada fácil me conter naquele instante para não fazer algum gesto que pudesse assustá-la e jogar tudo por terra. Minhas mãos comichavam de tão ávidas em querer tocá-la por sobre a blusinha decotada. Aqueles seios ali tão próximos e não poder tocá-los? A imagem deles desnudos reviravam em minha mente como que se realmente Ana Carla estivesse seminua. Um desejo ardente, sufocante e desmedido tomara conta de mim. Precisava fazer um esforço quase sobre-humano para manter o autocontrole. Havia perdido a espontaneidade e a naturalidade. Agia tão somente de forma calculada, como se seguisse um roteiro, para não atirar tudo ao vento. Eis a mais pura verdade.
Conversamos por mais alguns minutos. Minutos esses que passaram tão rápidos com se fossem segundos. Aliás, ela falou pouco de si. Parecia mais interessada em saber sobre mim, sobre o que eu fazia e coisas assim, coisas que eu fiz o possível para responder-lhe de forma a corresponder suas expectativas, onde a mentira embora com moderação foi uma grande aliada. Queria ficar mais tempo com ela, todavia não podia prendê-la e deixá-la em situação embaraçosa com sua mãe, até porque era preciso deixá-la à vontade, para que não se sentisse presa. A liberdade, o ir e vir é algo importantíssimo na percepção dos jovens. E qualquer ato de tolhimento é capaz de provocar a mais negativa das reações. Por isso, quando me disse que precisava ir para casa, não titubeei: concordei de imediato. Acrescentei inclusive estar ficando tarde. Então eu lhe disse que gostaria de encontrá-la mais vezes e era para me ligar. Não estipulei nem a hora nem o dia para não pressioná-la; e também porque queria saber o quanto havia ficado impressionada. Quanto mais rápido me ligasse, tanto mais estava interessada em mim. Foi a conclusão que cheguei.
Despedirmos-nos com um apertado abraço. E tudo poderia ter terminado ali se ela não houvesse me presenteado com o toque suave dos lábios em minha face. E não foi um único beijo como o leitor há de supor. Foram três beijinhos, desses que damos ao cumprimentar ou despedir de um conhecido do sexo oposto. No entanto, o último foi parar em outro lugar. Não, não foi por culpada dela. Mais uma esperteza de minha parte. No momento em que ia dar-me o último beijo, como que sem querer, virei o rosto e nossos lábios se tocaram. Foi tão somente um toque meio desajeitado, de leve, uma fração de segundo para dizer a verdade; contudo, aquilo me deixou tão feliz e exultado que quase não dormi naquela noite, imaginado o aproximar rápido do momento em que teria sua pureza manchada enquanto sorvia o doce mel de sua inocência. E esses pensamentos, os quais provocaram-me um excitamento indomável, teimavam em não me abandonar, feito um estado febril que, mesmo após ingerir um analgésico, permanece irredutível. E numa atitude extrema, pois chega um momento em que o desespero leva-nos a esse tipo de atitude, corri até o banheiro – embora procurasse não fazer barulho para não acordar meus pais – e então me masturbei, tendo-a como fonte de minhas fantasias. Só então, livre de tais fantasias, pude retornar à cama e repousar calmamente a cabeça no travesseiro para que a paz e o silêncio da noite pudessem prolongar-me o calmo e cálido arfar da respiração.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

INOCÊNCIA PERDIDA


Eu não posso mais te roubar
A inocência perdida
Pois os anos se encarregaram
De torná-la esquecida

Mas ainda posso te roubar
O frescor da juventude
Que ainda conservas
Nesse corpo sem virtude

E posso ainda te roubar
A beleza que desabrocha
Com toda a intensidade
Nesse teu rosto de cabrocha

Mas por que roubar-te tudo isso
Se tu os ofereces para mim
Num desejo intenso e impreciso
Em insinuações sem fim?

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

A MENINA DO ÔNIBUS - Capítulo I/2

No dia seguinte por duas vezes cruzei aquela mesma rua. Foi a forma que encontrei de topar com ela sem levantar suspeitas. Da primeira vez, no entanto, não obtive sucesso; contudo, da segunda encontrei-a sentada no meio-fio conversando alegremente com a mesma amiga. Cheguei a pensar que talvez não fossem se lembrar de mim. Ao me aproximar para cumprimentá-las, deram-me um largo sorriso. Aliás, Ana Carla foi mais comedida, dando a impressão de tratar-se de uma menina reservada e tímida. Tanto que a outra adiantou-se:
-- Você por aqui de novo?
-- Um amigo está montando uma rede de computadores em sua casa e pediu-me para ajudá-lo. Mora na outra rua – menti-lhes. Aliás, a ideia de dizer-lhes que o suposto morador vivia na outra rua e não na mesma em que me ocorreu quase instintivamente, como uma forma de me proteger, pois talvez conhecessem todos os habitantes daquela rua o que talvez as levassem a me fazer perguntas, as quais eu não teria respostas. Assim, citar um morador de outra rua, sem especificar qual, as chances seriam menores. -- E aqui estou eu de novo.
Sei que estou sendo um pouco longo demais; talvez até um pouco maçante, mas eu queria tão somente mostrar como a visão daquela menina levou-me a perder a cabeça e a arriscar tudo por algo que estava condenado, desde o início, a um final infeliz. Não pensem que eu não tinha consciência disso; sabia muito bem onde estava me metendo. No entanto, quantas e quantas vezes fazemos conscientemente algo de “errado” por não sermos fortes o bastante para resistir à tentação? Aliás, no caso de Ana Carla, como não o ser? Ela era mais que uma tentação, algo além da razão, algo que só pode ser creditado a uma perda temporária da capacidade de ponderação. De uma forma que não sei explicar, tudo em mim convergia em sua direção. Meus pensamentos, outrora um lago, de um instante para outro fizeram-se mar, um mar revolto como numa tempestade.
Não foi por acaso que voltei àquela rua no outro dia, no outro e no outro. E voltaria tantas vezes quantas fossem necessário para vê-la e falar-lhe. Precisava lentamente ir adquirindo sua confiança e tornando-me íntimo. Sabia que só assim poderia conhecer seus hábitos, a vida que levava e até seus sonhos para então ter alguma chance de possui-la, já que naquele momento este me era o único objetivo. Sabia também que teria de me apresentar impecavelmente trajado e de forma mais jovial possível; por isso, mesmo nos dias de mais calor, eu não descuidava do guarda-roupa. Quando se trata de uma conquista, tanto para o homem quanto para a mulher, o guarda-roupa diz exatamente o que a pessoa é. Um traje fino, elegante e ao mesmo tempo discreto mostra o quanto de inteligente e comedido é aquele que o usa, enquanto que outro, mesmo com rupas mais finas mas sem combinar, pode perfeitamente demonstrar não só falta de inteligência como também tratar-se de uma pessoa tempestiva, capaz de cometer exageros até mesmo diante de todos. Embora provavelmente ela não soubesse disso, a elegância só haveria de me render frutos. De mais a mais, era preciso fazê-la despertar o interesse por mim; e malvestido é que não conseguiria mesmo. Até porque minhas chances não eram nada animadoras; aliás, mais fruto de um devaneio que de uma possibilidade real.
No terceiro dia encontrei-a caminhando sozinha pela rua. Disse-me estar indo à casa de uma amiga. Para estender a conversa, perguntei-lhe se era na casa da amiga que estava no ônibus. Ela disse que não.
-- É da Fernanda, uma colega da escola – explicou.
-- Já sei! Final de ano, provas. Vão estudar juntas?
Ela titubeou por alguns instantes. E por fim contou-me ter perdido o caderno e estava indo à casa da colega para pegar a matéria, pois teriam prova no outro dia.
Pensei em perguntar-lhe onde estudava, em qual série e período, mas fiquei receoso de parecer petulante, querer saber demais. Tudo tinha sua hora e no momento preciso essas perguntas seriam respondidas. Agora, o mais importante era criar um elo de ligação entre nós dois, um laço a nos mantermos unidos. Isso inclusive me ocupou por duas noites seguidas, onde não fiz outra coisa a não ser ficar na cama, com os olhos fixos no teto enquanto procurava um meio de dar um passo definitivo, um bote certeiro para não acontecer o que aconteceu com uma jovem cujo nome já não recordo mais, onde numa falha perdi a chance de seduzi-la. Aliás, tratava-se de uma estratégia bastante conhecida. Pensara por uma ou duas noites nos passos, nos possíveis erros e acertos, tal qual um estrategista que, na eminência de uma grande e decisiva batalha, tenta adivinhar cada passo do inimigo e assim na forma de neutralizá-lo. Talvez por isso meus planos vêm dando tão certo nos últimos anos. Exceto uma ou duas, quase todas acabaram se iludindo de alguma forma.
Assim, dei o primeiro passo.
Contei-lhe que no dia anterior estava passeando pelo Shopping e, ao parar diante de uma loja, vi uma coisa que me fez lembrar dela (aliás, esta desculpa não era nova. Surgiu por acaso alguns anos atras, quando após encontrar uma jovem caixa de supermercado, a imagem dela voltou-me à memória aso passar diante de uma perfumaria. Talvez o cheiro de algum perfume tenha sido a causa dessa lembrança, embora não me recordasse de que ela usasse algum. O fato é que acabei comprando-lhe um perfume, o que me rendeu momento de intenso prazer, pois Tatiana não era dessas mulheres que confundem amor com sexo. Saímos umas três ou quatro vezes até que não houve mais nada a buscar um no outro. E, sem ressentimentos, cada um de nós seguiu o seu caminho). Ela deu um sorriso e quis saber o que era. Não contei. Este era o meu plano: despertar-lhe a curiosidade, o interesse. Não é esse o traço marcante dos jovens nos anos de adolescência? Só lhe disse que não o comprei porque não sabia se ficaria bem comprar um presente para uma garota que não conhecia. Que desculpa!
-- Se você quiser dar não tem nenhum problema -- respondeu-me ela, demonstrando grande interesse.
“Pimba! Fisguei. Esta está quase lá”, pensei, quase dando pulos de alegria, o que me levou a procurar forças para manter a calma, a fim de não deixá-la perceber um certo exagero em minha afetação.
-- Então eu vou comprá-lo. Mas não vou te contar o que é – falei com um sorriso contido. -- Amanhã cedo, se arrumar um tempinho, eu dou um pulo lá e compro. Se não der eu vou à noite. -- Meu coração parecia querer saltar. Digo isso não no sentido de sentir algo por ela feito alguém fisgado pela flecha do amor, mas sim devido à alegria de estar mais uma vez obtendo sucesso na arte da sedução, mais precisamente ao seduzir uma jovem capaz de me proporcionar grandes momentos de prazer. Sabia que ali estava a oportunidade imperdível de cair nas graças dela. O menor erro, o menor descuido e tudo perder-se-ia para sempre. Aliás, o que difere os vencedores dos vencidos é justamente a força com que se agarra uma oportunidade. O vencedor nunca a deixa escapar, por mais que lhe pareça impossível. -- Só não sei como fazer para te dar. -- Quis testar o seu grau de cumplicidade. Ela evidentemente sugeriria alguma coisa, e era isso que eu precisava para dar o próximo passo, pois este dependia do que ela dissesse ou sugerisse.
-- A gente combina uma hora e você passa aqui, eu te espero e você me entrega.
-- É! Pode ser -- exclamei, tentando demonstrar indiferença.
Confesso ter ficado desapontado. Esperava algo mais ousado. Diante da sua casa, aos olhos de todo mundo? Não, não. Assim não daria certo. Era preciso um lugar afastado, onde houvesse privacidade, onde o perigo de seus pais ou um vizinho nos surpreender fosse se não de todo eliminado pelo menos reduzido à quase zero. De forma que me foi preciso agir rápido, propôr-lhe algo ao mesmo tempo ousado mas sem que ela pudesse negar. Assim, declarei-lhe que na sua casa não ficava bem porque seus pais poderiam interpretar mal aquele gesto.
-- Eu posso te esperar ali na esquina e você me entrega. Que tal? -- sugeriu.
-- Tá bom então.
Naquele instante tive certeza de que o peixe só não fora fisgado como estava em minhas mãos. Por isso prossegui:
-- Vou fazer melhor ainda. Vou te dar o número do meu celular e aí você me liga. Assim que eu o comprar, a gente combina o local -- propus, tentando manter o controle da situação enquanto a cercava, sem dar-lhe tempo para pensar no certo ou errado, pois quando se sugere muitas coisas de uma vez, o interlocutor fica perdido, confuso, sem saber ao certo o que responder. -- Não é melhor?
-- Hum.. rum... -- assentiu meneando a cabeça.
Peguei um pedaço de papel e anotei o meu nome e o número do telefone. Depois lho entreguei dizendo-lhe para não perdê-lo. Ela, com um sorriso, pois parecia bastante à vontade, disse-me que não o perderia por nada deste mundo.
Quase estendi o braço para tocá-la. Desejava desesperadamente sentir a maciez de sua tez; todavia, no momento em que comecei a erguê-lo, recuei. E temeroso em dar um passo em falso, pois se continuasse era o que acabaria acontecendo, como acontecera com Maria Paula onde a pressa pôs tudo a perder, despedi-me dizendo:
-- Tchau! Um beijo.
Ela por sua vez despediu-se apenas com “tchau”, como quem gosta de economizar palavras, embora eu suspeitasse que o meu “um beijo” tenha sido a causa desse comedimento. Ela pode ter se surpreendido e ficado sem jeito, o que seria muito natural. Eu não devia ter me apressado, dado um passo largo demais, pois é nessas horas que o apressado come cru. Mas estava feito. E que está feto não tem volta. O melhor era não cometer outro erro. Um erro pode ser remediado, mas dois é impossível.
Bem, deixemos os erros de lado por hora. Enquanto me afastava, era tomado por uma euforia desmedida. Dir-se-ia sofrer um acesso de bobeira. Tanto que, ao me deparar no meio da rua com uma vazia e esquecida latinha de cerveja, sai chutando-a, sem imaginar que quem me visse fazendo aquilo poderia achar que eu não batia bem das ideias. Talvez isso me haja escapado justamente porque meus pensamentos vislumbravam momentos inesquecíveis com Ana Carla. E embora se tratassem de devaneios, o meu quarto num final de tarde era o cenário para momentos de prazeres intensos, onde nossos corpos lutavam desesperadamente para alcançá-lo, como se ela, ao invés de uma jovem inexperiente, fosse na realidade uma mulher, cuja experiência poderia ser equiparada a de uma profissional do sexo.