sexta-feira, 25 de junho de 2010

ADEUS À INOCÊNCIA - CAP. 10

-- Vamos pegar as frutas – disse ela, desvencilhando-se de mim muito envergonhada e surpresa ao mesmo tempo.
-- Espere aí! A gente não precisa ter pressa – falei, tentando puxá-la de volta aos meus braços. Apesar da timidez, o desejo, ao aflorar de forma tão intensa, acabou jogando-a para escanteio naquele momento.
-- Não. É melhor não – afirmou Marcela.
-- Mas nós não estamos fazendo nada demais. Ninguém está vendo – insisti, tentando mantê-la sobre meu controle.
-- Já disse que não – foi categórica. – Se você não parar eu volto.
Aquilo me deixou desconsertado. Num momento ela parecia querer, noutro já não queria mais. Mesmo assim, quis arrancar-lhe nem que fosse outro beijo.
-- Ta bom, então – concordei. – Mas então só me dá mais um beijo.
Ela afrouxou a guarda e deixou que a beijasse mais uma vez.
Não sei o que me aconteceu naquele momento. Jamais havia pensado ou feito algo parecido. Tentar agarrar a menina a força era algo inadmissível. Ainda mais por se tratar da Marcela, por quem meu coração balançava.
Quando me dei conta do que havia feito, fiquei deveras envergonhado, com vontade de fugir daquela ilha a nado. Foi uma vergonha sem procedentes, muito mais do que ficara na madrugada quando me masturbei pensando nela e na Luciana. Naquele instante, se pudesse desaparecer, ficar invisível eu teria feito. Tanto é verdade que, ao longo do dia, fiz o possível para que nossos olhares não se cruzassem.
Além de bananas, apanhamos umas frutas que pareciam goiaba. A diferença estava no tamanho e no sabor. Eram bem menores e de sabor mais ácido. Eu não me lembrava de ter visto aquele fruta alguma vez. Mas como não era de comer frutas, isso não quer dizer que minha mãe nunca tenha comprado.
Voltamos em silêncio e não tocamos mais no assunto.
Acordei Ana Paula e falei para ela ir se lavar, pois teríamos um longo dia. Havia muito que fazer. Antes de ir se lavar, ela disse que queria tomar água de coco. Então fiz o sacrifício de subir numa palmeira de apanhar alguns.
-- Precisamos construir uma cabana – disse Luciana. – É muito ruim ficar dormindo ao relento, nessa areia que deixa a gente toda suja.
-- Também acho – disse Ana Paula.
Marcela mantinha-se calada e distante, com se as discussões não lhe dissessem respeito, embora isso provavelmente fosse consequência do que fizemos cerca de uma hora atrás. Notei isso, mas também não tinha coragem de lhe dirigir a palavra.
-- O problema vai ser fazer isso sem ferramentas. Só temos uma lasca de pedra que não serve para muita coisa. Temos que pensar numa outra forma de cortar a madeira. – falei.
Ficamos algum tempo sentados ao lado da fogueira, como se estivéssemos perdidos, sem saber o que fazer. No momento ela era tão somente alguns gravetos em combustão.
Não sei o que se passava na cabeça daquelas meninas. Eu porém tentava encontrar uma forma de construir uma cabana, não só para passar a noite como também para nos abrigar da chuva. Por sorte o céu permanecia limpo. Nenhuma nuvem à vista. Certamente teríamos mais outro dia quente, abafado e ensolarado; mais um dia daqueles onde a gente não tem vontade de fazer nada.
Cerca de meia hora mais tarde, levantei e falei:
-- Não adianta a gente ficar aqui à toa. Vamos tentar quebrar alguns galhos e usar eles para construir uma cabana.
-- Então vamos – disse Ana Paula, que construía castelos na areia.
-- Só que alguém vai ficar aqui tomando conta do fogo. Quem se habilita? – perguntei.
As meninas olharam umas para as outras. Depois Marcela respondeu:
-- Eu fico.
Entramos na floresta por uma trilha que encontramos poucos metros da cabana, a qual seria usada com certa frequência para penetrarmos na ilha. Percebi que aquela trilha tinha sido feita por algum animal. De repente uma possibilidade me passou pela cabeça. Se havia uma trilha, havia animais naquela ilha. Então poderíamos caçá-los para comer. Isso não era o mais importante agora, mas discutiria isso com as meninas mais tarde. No momento, só a cabana era nosso objetivo.
Não sei quanto tempo demoramos, embora não chegamos a ir longe. Mas, quando voltamos, carregávamos dois troncos de madeira não muito grossos e alguns galhos que conseguimos quebrar com o uso de cordas de cipó.
Foi o que nos ajudou. Ao encontrar os ramos de cipós, tivemos não só a ideia de apanhá-los para prender a madeira uma na outra como para quebrar galhos das árvores.
Gastamos o dia todo para construir nossa primeira cabana. E na verdade, ela não servia para muita coisa. Claro que ela nos protegia do sol e também dava a aparência de moradia. De certa forma, aquela cabana também dava a sensação de segurança, de que tínhamos um lugar para dormir.
A cobertura provisoriamente foi feita com folhas de bananeira. Mas no dia seguinte seria substituída por capim, tal como alguns de nós tínhamos visto em livros e na TV. A sugestão inclusive partiu da Luciana. Foi ela quem disse que tinha parentes que moravam no interior de Minas Gerais, os quais possuíam uma casa coberta dessa forma. Ela não sabia ao certo como o capim era amarrado, mas disse que não deixava a chuva entrar.
Para deitarmos, o chão foi forrado com capim e depois coberto com folhas de bananeira. Era a única coisa que encontramos que não nos causa desconforto. Porque deitar sobre o capim não seria possível.
Assim que começou escurecer, fizemos outra reunião. Havia alguns detalhes que precisavam ser discutidos.
-- Alguém ainda se lembra das regras que definimos ontem? – perguntei.
-- Manter o fogo sempre aceso – respondeu alguém.
-- Construir uma cabana – disse a outra.
-- É isso aí – falei. A cabana já está construída. Bem ou mal é uma cabana. Aos poucos a gente vai melhorando ela.
-- Você tem toda a razão, Sílvio – disse Luciana.
-- Então, agora está na hora de definirmos mais algumas regras. Vocês não acham?
-- Não sei – respondeu Ana Paula. – Será que a gente precisa de mais regras?
-- Claro que sim! – falei. – Se não existissem regras, o mundo seria um caos. Como é que as pessoas iam conviver umas com as outras sem regras?
-- Mas aqui a gente está numa ilha – argumentou minha prima. – Só tem nós quatro. Para que regras? Não vamos ficar aqui por muito tempo, mesmo!
-- De certa forma você tem razão – interveio Luciana. – A gente poderia ficar um tempo sem regras. Ia ser bem legal. Aí a gente ia poder fazer tudo que quisesse – continuou ela, cheia de empolgação.
-- Eu não concordo – discordou Marcela, que até então se mantinha em silêncio. – Precisamos sim de regras. Ou vocês acham que somos animais?
-- Não é nada disso! – protestou Ana Paula. – Eu só quis dizer que somos civilizados o bastante para ficar sem regras nesse lugar até sermos resgatados. Talvez amanhã ou depois já saímos daqui. Se vamos ficar por pouco tempo, pra que regras?
-- Tudo bem, então – falei. – Já que vocês querem assim. Mas como líder, quero determinar duas coisas: primeiro, vamos continuar tomando conta da fogueira; segundo, tudo deve ser dividido, desde as tarefas mais simples até o que formos comer. Ninguém deve ter o privilégio de não fazer as coisas ou ter mais que os outros.
-- Também concordo – disse Luciana.
-- Por mim, tudo bem – falou Ana Paula, como se aquilo não lhe fizesse a menor diferença.
-- E você, Marcela? O que acha? – perguntei.
-- Se a maioria acha que não precisamos de regras, então ficamos sem elas. Mas só quero ver até onde isso vai dar. Aposto como daqui uns dias, vamos necessitar delas.
-- Não vamos não – disse Ana Paula. – Até lá já estaremos em casa.
-- Espero que você tenha razão, garota – disse Marcela.
E ali ficamos conversando por mais algum tempo. A conversa caiu para temas banais dos quais não me recordo. Falávamos de situações e recordações de momentos engraçados na escola e no dia-a-dia.
Depois alguém sugeriu que fossemos tomar banho. E assim fizemos os quatros.
Foi muito divertido. Foi um dos momentos de maior descontração desde que chegamos naquela ilha. Brincamos de mergulhar e passar no meio das pernas do outro em baixo d’água, de pega-pega no meio das ondas e muito mais.
Só não ficamos mais porque estava começando a escurecer e era preciso abastecer a fogueira e buscar mais alguma coisa para comer.

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