O tão temido “Estado Islâmico”, com sua violência, com seu desprezo pela vida, muitas vezes se assemelha aos bárbaros da antiguidade. Aliás, como não ver o tratamento dados por eles aos habitantes dos territórios que conquista e não se lembrar de Átila, o huno? Ou até mesmo Gengis Kahn? Talvez os mais terríveis homens da história. Mas Átila, Gengis Kahn e tantos outros fazem parte de um remoto tempo, de uma era onde a humanidade – senão toda, pelo menos a grande maioria dela -- ainda vivia mergulhada nas trevas da ignorância e do desprezo ao ser humano, pois a vida de um homem valia tanto quando a de qualquer outro animal. O “Estado Islâmico”, por outro lado, é fruto de uma era onde a vida é o bem mais precioso que se pode ter e onde qualquer ato de violência contra um semelhante causa indignação e revolta. Então, por que o surgimento de uma organização tão sanguinária e cruel, principalmente contra os inimigos? Seria uma volta à barbárie? Não, definitivamente não. De fato ele é fruto do fracasso daquilo que chamamos sociedade, uma vez que ela não é mais capaz de suprir os anseios de uma população materialista, individualista e ávida por bens materiais, onde a vida se tornou inclusive uma mercadoria. E na incapacidade de suprir uma necessidade cada vez maior de consumo, o homem se sente frustrado e sem perspectiva com relação ao futuro. E é aí que entra o “Estado Islâmico”. Eles prometem uma nova ordem social, um mundo menos materialista e, principalmente, uma eternidade gloriosa após a breve passagem pela vida terrena, coisa que a civilização ocidental não oferece mais, aliás como já afirmava Nietzsche em pleno século IXX, ao declarar que “Deus está morto” (A Gaia Ciência, aforismo 341). Enfim, o “Estado Islâmico” só precisou de um vasto terreno fértil, onde semeava o caos, para plantar suas sementes, as quais podem sem encontradas em abundância nos quatro cantos do mundo, principalmente no ocidente.
Apaixonado por literatura desde pequeno, começou a escrever as primeiras histórias aos 11 anos e desde então não parou mais. Parte desse material escrito nos últimos 30 anos você poderá encontrar aqui, inclusive trechos de obras que estão sendo preparadas para a publicação.
terça-feira, 30 de junho de 2015
segunda-feira, 29 de junho de 2015
O MAIOR EQUÍVOCO DA NATUREZA
Em meio a uma hipocrisia desmedida
Vou equilibrando minha vida
Na esperança de que lá adiante
Depare com um futuro diferente;
Mas o tempo, esse inimigo da vida,
Faz minha esperança perdida.
Vejo a humanidade decadente
Definhando a cada instante.
Rumo a uma inevitável extinção
Talvez agora seja tarde demais
Para uma mudança de direção
O homem é o maior equívoco
Da natureza. E dentre os animais
À existência é quem traz maior perigo
domingo, 28 de junho de 2015
ADEUS À INOCÊNCIA - CAP. 59
Naquela
manhã, como acontecera outras vezes, não tínhamos o que comer.
Assim, para quebrar o jejum, tomamos água de coco. Súbito,
consultando um pedaço de tábua onde jazia uma série de riscos,
Marcela disse:
--
Já não tenho certeza de quanto tempo estamos aqui. Será que não
esquecemos de marcar algum dia?
--
Não sei – respondi. -- Você é que faz isso todos os dias.
--
23 dias. Mas parece que estamos uma eternidade aqui – lamentou,
deixando escapar uma voz triste. -- Será que já desistiram da
gente?
--
Acho que as autoridades já. O Corpo de Bombeiros com certeza já
encerrou as buscas – asseverou Luciana.
--
Mas nós tamos vivos. Eles num podem parar de procurar a gente –
exclamou Ana Paula.
--
Por que não? Não vão procurar a gente a vida inteira. Como não
acharam a gente, para todos efeitos já estamos mortos – afirmou
Luciana.
--
Será que nossos pais também desistiram? -- perguntei.
--
Não, acho que não. Eles ainda tem esperança de encontrar a gente –
disse Marcela. -- Talvez pensem que a gente esteja perdido numa ilha
qualquer.
--
Como realmente a gente tá – acrescentou minha prima.
--
Só não entendo porque nunca vieram procurar a gente aqui – falei.
--
Talvez porque tenham encontrado os destroços do barco muito longe
daqui. Eles não vão procurar o oceano inteiro. Procuram até um
certo ponto. E se não vieram procurar a gente aqui quer dizer que
viemos parar muito, mas muito longe de onde o barco afundou –
explicou Marcela. -- a gente ficou boiando por quase dois dias.
--
Também acho – concordei. -- Mas acredito que dia menos dia vai
aparecer alguém aqui. Ai será nossa chance de voltar para casa.
--
Quanto a isso, tenho de concordar com vocês. Só acho que não será
tão cedo. Não encontramos marcas recentes da passagem de alguém
por aqui. E por quê? Porque esta ilha é muito pequena e sem
importância. Claro que algum curioso vai vir aqui qualquer dia. Mas
pode ser que demore ainda alguns meses – disse Luciana.
--
Mas será? -- indaguei.
--
Eu estava até pensando sobre isso uma noite dessas, enquanto tomava
conta da fogueira. A gente tinha viajado em direção ao norte. Isso
quer dizer que talvez a gente nem esteja longe do litoral, mas longe
o bastante da rota de navegação. Por isso nunca vimos sinal de
barcos ou navios – continuou Luciana com um certo ar de
superioridade, como se aquela suposição fosse fruto de uma
inteligência excepcional embora, é preciso admitir, ela fosse
dotada de uma esperteza invejável. Prova disso era a facilidade com
que me manipulava. -- Também não adianta a gente ficar lamentando.
-- Levantou-se, limpou a areia das nádegas e acrescentou: -- Estou
com fome e não temos nada para comer. Não é melhor a gente tratar
de pegar uns peixes logo?
--
Tem razão – falei, levantando-me. -- Vou pegar uns enquanto vocês
vão procurar alguma coisa para a gente comer.
--
E você vai me ensinar a pescar e a usar a flecha como prometeu ontem
– lembrou-me Luciana. -- E vocês duas, que gostam tanto de andar
no mato, vão fazer a parte de vocês. Precisamos matar algumas
dessas aves. Tantas por ai e nós aqui passando fome.
Ana
Paula e Marcela levantaram-se. Apanharam a lâmina de ferro e
partiram desejando-nos sorte na pescaria.
--
Já que você quer tanto aprender a pescar, então vamos. Só quero
ver no que vai dar isso – felei instantes depois, apanhando a lança
que jazia recostada a um dos cantos da casa. -- Pensa que é fácil?
Levei tempo para aprender.
--
Tá pensando que não sou capaz de aprender? Você vai se surpreender
– disse ela, pegando-me na mão, prostrando-se bem a minha frente e
acrescentando: -- Mas antes quero um beijo bem gostoso. Quero sentir
o gosto da tua boca. Estou com saudades. Se não fosse aquelas duas
ia ficar te beijando o tempo inteiro.
--
Agora não. Elas podem voltar – falei, procurando evitar que aquele
beijo pudesse ser o primeiro passo de outros que acabariam me levando
a deitar-se com ela.
--
Não. Elas não vão voltar. E você também não vai querer que eu
fique brava, né? Você sabe que quando não me obedecesse eu fico
muito brava e perco a cabeça, não sabe?
Nisso,
senti suas mãos agarraram-me por entre as pernas a dor embora leve
chegou-me ao cérebro.
--
Sei sim -- respondi, vencido.
--
Ótimo. Então seja um bom menino.
A
dor desapareceu e então senti sua mão escorregar um pouco para cima
e agarrar-se outra parte do meu corpo; mas ao invés de apertá-la,
apenas a acariciou. Nisso, meus lábios haviam encontrado os delas e
sua língua procurava desesperadamente enroscar-se a minha.
Eu
apenas e segurava pelos quadris enquanto ela usava um dos braços
para me prender pelo pescoço. Súbito porém, ela o tirou e pegou
num dos meus punhos e levou e o ergueu até que minha mão foi
parar-lhe no seio. Como se eu fosse um idiota ou não soubesse o que
fazer, ela pegou-me a mão a fez apertar-lhe o seio. Talvez por não
conseguir fazer várias coisas ao mesmo tempo, a outra mão, a qual
parara de mexer como meu falo, voltou a deslizar sobre ele para
frente e para trás. Isso me levou a espremer os quadris contra os
dela a fim de evitar que ele continuasse, pois assim não haveria
espaço para os movimentos de sua mão. Ela porém interpretou meu
gesto de outra forma. Pensou que eu tencionava penetrá-la. Assim,
afastou as pernas e seus ágeis dedos conseguiram empurrar-me o falo
para o meio delas.
Até
então eu procurava conter a excitação. Mas diante de certas
circunstâncias, não tive como evitá-la. Embora tenhamos por hábito
julgar aquele que não foi capaz de conter seus instintos, na
realidade deveríamos ser bem mais condescendentes com essas pessoas,
uma vez que em se tratando do instinto praticamente nada pode ser
feito para contê-lo. Assim, meu falo reagiu instantaneamente.
--
Isso. Deixa ele ficar do jeito que eu gosto. Tô com saudades dele –
disse-me ela, quando seus lábios finalmente deixaram os meus.
--
Mas a gente tem que pescar. Não temos nada para comer –
argumentei.
--
Daqui a pouco a gente vai. Os peixes não vão fugir. Elas também
não voltar tão cedo – disse ela. -- Vem cá – deu um passo para
trás e sentou numa das camas, a qual estava forrada com folhas de
bananeira. -- Estou pegando fogo.
Não
compreendi aquele pegando
fogo
embora cheguei a deduzir que se tratava de algo relacionado com a sua
vontade em se deitar comigo. Aliás, não de importância a isso.
Principalmente após vê-la deitar-se e abrir as pernas para me
receber.
Tudo
foi muito rápido, mais do que das outras vezes, talvez porque
enquanto a fodia, imaginava Marcela e não Luciana entre mim e aquela
cama. Ela porém manteve-me preso entre seus braços. Meu rosto jazia
apoiado entre os seios dela. Os lábios jaziam entreabertos ao lado
de um dos mamilos dela, o qual, momentos antes, por mais de uma
sofrera a pressão de meus dentes.
--
Alguma coisa está acontecendo comigo – disse ela, dando fim aquele
silêncio que se formara após o gozo.
-- Meus peitos estão sensíveis e até doeram quando você ficou
chupando eles. Isso antes não acontecia.
Levantei
a cabeça, fitei-os e só então a indaguei:
--
Como assim?
--
Não sei. Sinto que tem algo estranho. E ainda não menstruei. Talvez
seja por isso. Já vai fazer um mês que fiquei da última vez.
--
Menstruar
é
ficar naqueles dias? -- perguntei, lembrando do que Ana Paula me
dissera no dia anterior.
--
É.
--
E o que acontece se você não ficar?
--
Se eu não ficar quer dizer que possa estar grávida.
--
Gravida?
-- dei um sobressalto e sai de cima dela.
--
É. Não sei ainda. Mas pode ser que a gente vai ter um bebê.
--
Eu num quero ter um bebê contigo – falei com ar de revolta e
sentindo-me usado, como se o mundo estivesse por desmoronar-me na
cabeça. E ao imaginar-lhe um recém-nascido nos braços e ela me
oferecendo aquele bebê, dizendo-me que era nosso filho, subitamente
fui tomando pelo desejo de pegá-lo a atirá-lo longe como teria
feito uma criança mimada ao ganhar um brinquedo que não lhe
agradasse. E ao me ver fazendo isso, não fui tomado pelo
arrependimento, nem mesmo de ter aqueles pensamentos. Aliás, ao
supor que este filho de fato viesse ao mundo, senti apenas ódio,
tanto dela quanto da criança. “Se ela quer tanto ter um bebê,
então que fique com ele. Eu num quero, não quero o bebê dela. Eu
amo a Marcela e é só ela que eu quero...”, lembrou-me de pensar.
--
Por que não? Vai ser incrível.
--
Não. Não vai ser incrível coisa nenhuma. Eu num quero! – falei,
demonstrando ainda mais irritação. -- E nem tenho idade pra isso.
--
Mas se eu estiver, você não pode fazer nada. E aposto que fosse com
a Marcela você ia querer. Não é verdade?
Não,
eu não queria ter um filho com ela também. Pelo menos não desejava
isso. Talvez, quando fosse mais velho e estivesse preparado para ser
pai, mudasse de opinião. Mas naquela ilha não queria engravidar nem
uma nem a outra.
--
Claro que não.
--
Duvido. Mas aposto como você vai mudar de ideia quando ver minha
barriga crescer. E meus peitos vão crescer também. Sabia?
--
Não, não vou mudar. Já disse que num quero ter um filho teu.
--
Bobinho. Se eu não tiver, vou ficar mais cedo ou mais tarde. E você
não vai poder fazer nada.
De
fato ela estava certa. Não estava em minhas mãos decidir se ela
teria ou não um filho meu. Ela me dominava e fazia de mim o seu
brinquedo. Enquanto eu continuasse a despejar quase que diariamente
todo o meu sêmen dentro dela, seria apenas questão de tempo para
que fosse fecundada, embora eu não soubesse direito como engravidar
uma mulher, uma vez que sabia que o fato de ter se deitado com ela
não era o suficiente.
Luciana
sentou na cama e olhou para o meio das pernas. Em seguida levou a mão
lá e a retirou toda lambuzada.
--
Nossa! Quanta porra! Melhor a gente ir se lavar. Isso aqui vai me
escorrer pelas pernas abaixo – disse levantando-se.
Ela
se aproximou e tentou me abraçar, mas eu me afastei, empurrando-lhe
a mão para longe de mim.
--
Não fica assim. Eu ainda não sei se estou grávida. E se tiver
também, você ficar com raiva de mim não vai adiantar de nada. Vem
cá, seu bobinho. Não se preocupa com isso agora. Vamos pegar
aqueles peixes. Estou faminta.
Permaneci
em silêncio. Apanhei a vara e sai. Luciana me seguiu de perto,
puxando assunto a fim de fazer com que eu falasse consigo. No
entanto, não me deixei dobrar. Mantive-me calado. Aliás, aproveitei
aquele silêncio para pensar em Marcela e no que lhe diria caso
viesse a ser pai.
--
Como é que eu devo segurar a lança? -- perguntou ela, quando
chegamos. -- Assim? -- Levantou-a, segurando na altura do ombro, como
eu fizera da última vez em que a levei para me ver pescar.
--
É – respondi, abrindo a boca pela primeira vez desde que deixamos
a cabana. -- Fala baixo, senão eles assustam – sussurrei.
--
E agora? O que eu faço? -- perguntou ela num tom de voz tão baixo
que quase não consegui ouvir.
--
Você mira ele. E quando tiver certeza de que vai acertar ele, atira
ela com força – expliquei.
Luciana
ficou imóvel por alguns instantes, com os olhos fixos num peixe que
parecia não se importar com a nossa presença, talvez porque não
tinha nos notado ali. Súbito, ela lançou a vara, mas esta enterrou
a ponta na areia a cerca de meio metro do peixe. Este, com o som
produzido, desapareceu da nossa vista.
--
Merda! Errei! -- esbravejou. -- E agora?
--
Pega a lança e vamos esperar um pouco que aparece outro. Às vezes,
até mais de um – expliquei. -- Ai você tenta de novo. Mas tente
mirar mais certo dessa vez.
Alguns
minutos depois, outro peixe apareceu.
--
Você não vai me escapar – balbuciou ela.
Deixei
que ela mirasse e tentasse acertá-lo. Mas ela não teve a paciência
necessária para esperar o melhor momento. Ela simplesmente atirou a
lança e esta foi parar ainda mais longe.
--
Quer saber duma coisa? Não quero mais aprender a pescar. Isso é
muito difícil. É coisa para homem – disse ela, dando alguns
passos sobre as pedras e apanhando a lança. -- Toma! Vou ficar em
cima daquela pedra olhando. Se eu ficar aqui tentando, não vamos ter
o que comer hoje – acrescentou por fim, enquanto se afastava. Deu
alguns passos e sentou numa grande pedra, cerca duns dois metros de
onde eu estava.
Fez
silêncio por alguns instantes. Então ela principiou a dizer alguma
coisa. Mas antes que ela terminasse a palavra, fiz-lhe sinal de
silêncio. Ela calou-se até que me viu atirar a lança e apanhá-la
em seguida com um peixe pequeno se debatendo, embora devesse pesar
umas 300 gramas.
--
Nossa! Que rapidez! -- exclamou ela, com empolgação. -- Pelo menos
nisso você é eficiente – acrescentou em seguida com um tom de
sarcasmo.
Depois
de tirar o peixe da lança e espetá-lo na vareta que eu costumava
usar para transportá-los, fiquei na espreita a fim de fisgar o
próximo. Às vezes, eles retornavam rápido, mas vez ou outra tinha
de ter paciência e esperar uns bons minutos.
O
próximo não demorou muito. Aliás, vieram três de uma vez. Assim,
pude escolher o maior. Lancei a vara e por pouco não o errei. A
ponta atravessou-o próximo do rabo. Se eu não tivesse sido rápido
em puxá-la para fora e dar-lhe uma pedrada na cabeça provavelmente
teria escapado mesmo assim. Após parar de se mexer, espetei-o na
vareta junto com o outro e dei-os para Lucina segurar.
--
Nossa! Esse é bem grande hein – disse ela. -- Hoje vamos passar
bem.
--
Tamos com sorte – respondi.
Voltei
a ficar na espreita. Levou algum tempo até que consegui avistar
outro um pouco mais adiante de onde fisgara o último. Mirei-o e
então atirei a lança. Dessa vez porém não tive sorte. Errei-o por
alguns centímetros.
--
Merda! -- exclamei. -- Escapou. E o pior que agora eles vão ficar
com medo e vão demorar a aparecer. -- De fato, normalmente era isso
que ocorria. Eles pareciam pressentir o perigo e só retornavam
depois de algum tempo. Vez o outra eu tinha de esperar um tempão até
que conseguisse avistar outro.
Esperamos
por uns cinco ou dez minutos. Talvez até mais, já que não tínhamos
como marcar o tempo, uma vez que o meu relógio de pulso fora
danificado pela água e deixara de funcionar desdes a nossa chegada
àquela ilha.
Luciana
manteve-se em silêncio a maior parte do tempo. Súbito, quando eu
circulava entre as pedras a fim de ver se avistava mais algum peixe,
ouvi-a perguntar:
--
Você acha a minha bunda bonita?
Desviei
os olhos em sua direção e a vi curvada sobre a pedra, mostrando-me
o traseiro. Olhei para suas nádegas com uma certa indiferença.
Ainda não havia reparado atentamente em seu traseiro. Nos seios sim.
Achava-os bonitos. Talvez porque eram grandes. Mas aquele traseiro
não me despertara a mesma atenção. Reparando-o porém naquela
posição não havia como negar os seus atrativos.
--
Ah, sei lá! Nunca reparei – respondi.
--
Então repara, seu idiota!
Ela
mexeu os quadris e balançou o traseiro como que o oferecesse a mim.
Aliás, fez questão de se curvar mais a fim de que eles se
destacassem.
--
E aí? O que você acha?
--
É bonita sim – respondi, como quem cumpre apenas a obrigação de
dar uma resposta.
--
Você gostaria de me pegar assim? Por trás? -- Ela afastou um pouco
as pernas e tornou a mexer os quadris.
Aquela
pergunta me desconsertou de tal forma que por pouco não perdi o
equilíbrio e caí sobre as pedras. O que me afetou não foi a
pergunta dela, mas a lembrança que dos quinze dias passados na casa
dos pais de Fabrício, fazendo-lhe companhia enquanto seus pais
viajavam para São Paulo. Súbito, veio-me a imagem de meu primo
excitado embaixo do chuveiro (eu também estava) brincando de passar
o seu pênis nas minhas nádegas. De repente ele me abraçou por trás
e o introduziu no meio de minhas pernas, movimentando os quadris para
frente e para trás enquanto acariciava o meu pênis. Não sei por
que razão, ele, resolveu me chamar para “meter”. Eu não sabia
ao certo o que ele estava querendo dizer, por isso disse que não.
Mas ele insistiu e foi persuasivo. Pressionado e sem ter como escapar
ou a quem recorrer, já que só a empregada da família estava em
casa, acabei aceitando. Só não imaginava que ele fosse me penetrar
e, apesar de meus protestos, continuar até chegar ao orgasmo.
--
Eu? Por quê?
--
Porque eu li outro dia numa Playboy
do meu pai que a maioria dos homens adoram possuir a mulher por trás,
como os animais fazem. Agora eu me lembrei disso assim do nada. Ai
pensei: será que ele também gosta? Você não gostaria de trepar em
mim assim? -- Luciana continuava a mexer os quadris como se
procurasse me excitar.
Talvez
se eu fosse um rapaz mais velho e não tivesse o trauma de ter vítima
desse tipo de experiência, tivesse ficado excitado na hora, mas eu
era apenas um menino de 13 anos, totalmente averso ao sexo anal. E
mesmo que não fosse esse trauma, ainda sim seria bem possível que
me exibir o traseiro não me excitasse como ela provavelmente estava
imaginando. A chama da volúpia ainda não tinha aquela força e
virilidade tão comum nos rapazes que trilham o misterioso caminho da
puberdade. De mais a mais, tínhamos transado pouco antes. Assim,
procurando ocultar minha afetação e mostrado ar de indiferença,
tornei a responder:
--
Ah, não sei! Talvez.
--
Como não sabe?
--
Não sabendo. Eu nunca fiz! -- menti.
Fabrício, para tentar me convencer a
deixar que ele me penetrasse novamente na noite do dia seguinte,
quando já estávamos na cama, disse que me deixaria “meter” nele
também. Mais uma vez persuadido, acabei aceitando. Mas, após o
gozo, ele rolou para o lado e disse que não estava mais com vontade
e que no outro dia deixaria. Envergonhado como estava, não tive
coragem de insistir. No outro dia, ele realmente cumpriu a promessa
quando tomávamos banho. Deitou no chão do banheiro e disse para eu
“trepar” nele, mas deixou bem claro que não era para “enfiar”.
Aliás, fiquei em cima dele por cerca um minuto. Talvez percebendo
que aquilo não daria em nada, pois até então eu nunca tivera um
orgasmo, disse: “agora é a minha vez”. Trocamos de posição e
assim que trepou em mim, penetrou-me. Dessa vez porém não cheguei a
protestar. Apenas aguardei.
--
Então por que não vem descobrir?
--
Não. Num tô com vontade. Tenho que tentar pegar mais uns peixes --
esquivei.
Apesar
da minha recusa, ela continuava a mexer os quadris. Agora,
entretanto, mexia-os para cima e para baixo. Fitei-a por alguns
instantes. Temendo porém que aquilo acabasse me afetando e me
levasse a aceitar o seu convite, virei para o outro lado e fingi
procurar peixes na água.
--
E se eu te desse o cu?
Confesso
não saber onde enfiar a cara. No entanto, não podia deixar que ela
percebesse. Lembro perfeitamente de minha preocupação um tanto
exagerada com isso, talvez para ocultar o meu passado. De forma que
me fiz de desentendido.
-- Como assim?
--
Você não sabe o que é dar
o cu?
-- perguntou ela com um ar de incredulidade, como se eu tivesse a
obrigação de saber tudo.
--
Não. Quer dizer, sei mais ou menos – menti.
--
Cada vez eu tenho mais certeza que você é um idiota. Dar
o cu
é deixar você enfiar o teu pinto no meu cu, ao invés de enfiar na
minha boceta. Entendeu agora? -- Luciana parecia irritada, pois seu
tom de voz havia mudado. E isso ficou ainda mais claro quando ela se
ergueu e virou de frente para mim.
--
E para que eu ia querer enfiar meu pinto na sua bunda? -- Proferi a
palavra bunda
porque não tive coragem de falar cu.
Fabrício,
nas primeiras vezes também disse bunda,
mas depois, demonstrando intimidade, simplesmente me agarrava por
trás e dizia: “vem cá, deixa eu comer seu cu”,
o que eu consentia.
--
Porque eu li na mesma revista que muitos homens adoram fazer isso.
Eles dizem que sentem mais prazer. E algumas mulheres diziam que
também sentem muito prazer. Não vejo qual a graça disso, mas se
você quiser experimentar eu também deixo. Você quer? -- perguntou
ela, vindo em minha direção.
Embora
eu estivesse de costas, mergulhado em velhas lembranças, pude
perceber seu aproximar. Ouvia seus passos sobre as pedras.
Tentando
demovê-la de qualquer tentativa em me seduzir ali, disse-lhe de
forma categórica um “não”.
--
Ah, mas eu vou querer experimentar. Nem que seja só para saber como
é. – Pude ouvir sua voz cada vez mais próxima. -- Você vai
enfiar para a gente experimentar, não vai? -- As últimas palavras
soaram tão próximas que pude sentir sua respiração na minha
nunca. Então ela me abraçou e escorregou a mão direita até meu
falo e o acariciou. -- Que tal se a gente experimentasse agora? Tô
morrendo de curiosidade.
--
Não. Agora não – respondi, tirando-lhe a mão e me desvincilhando
dela.
--
Por que não?
--
Porque não estou com vontade – tornei a responder. -- E eu preciso
pegar pelo menos mais um peixe. Esses dois não vai dar para matar
nossa fome o dia todo – acrescentei.
Contrariada,
Luciana acabou dizendo:
--
Tá bom então, seu frouxo! Mas mais tarde, você vai fazer.
Ela
voltou a sentar na mesma pedra e tornou a ficar em silêncio me
observando. Não sei o que se passava naquela cabeça, mas nas poucas
vezes em que virei os olhos em sua direção ela parecia
compenetrada, como se estivesse perdida em pensamentos. Talvez
divagasse acerca de seus pais ou até mesmo com alguma coisa não
relacionada a mim, mas hoje tenho quase a certeza de que simplesmente
fantasiava comigo. E só saiu daquele estado de absorção e correu
em minha direção quando gritei que pegara mais um peixe.
--
E esse também é grande – falei, ao espetá-lo junto com os
outros.
Pouco depois peguei o quarto peixe e
dei aquela pescaria por encerrada, temendo que ela viesse a insistir
em fazer aquelas coisas, uma vez que aqueles quatro peixes nos eram
suficientes para aquele dia, apressei em chamá-la para retornarmos.
terça-feira, 9 de junho de 2015
EU QUERIA PARAR O TEMPO
Eu
tento voltar no tempo, num passado em que você ainda não tinha
entrado na minha e nem fazia parte do meu mundo, transformando a
minha e a tua história numa coisa só; mas confesso-te que não
consigo. Não que o passado seja assim tão distante ou o tempo tenha
se encarregado de envolver em densa névoa as minhas lembranças.
Não, não é nada disso. É que o meu passado parece tão
insignificante e tudo que vivi ou experimentei me parece tão
superficial. É como se tudo não tivesse o menor valor e tivesse
sido apenas uma “ponte para que eu chegasse a
você”, meu amor.
Talvez
eu esteja exagerando e vendo as coisas de uma forma distorcida. Mas o
que fazer? Se, depois de te conhecer e me apaixonar por você,
tornei-me outro homem? Confesso-te que num primeiro momento, eu me
senti “como um frágil barco surpreendido em alto mar por um
vento furioso”. Mas eu nunca
tinha me apaixonado antes. Era
tudo tão novo e repleto das mais intensas sensações. E
o amor tem dessas coisas: adiciona
aos nossos sentidos um novo filtro comandado pelo coração, dando
uma vivacidade e uma nova capacidade, mais humana diga-se de
passagem, de ver, ouvir, sentir e interpretar o mundo a nossa volta.
E tenho de te confessar, meu amor, que tudo a minha volta hoje
me parece tão mais belo, tão
mais cheio de vida e cor. E
devo tudo isso a você.
Cada momento com você é mágico, cheio de vivacidade e envolto nas
mais intensas emoções. Às vezes, eu tenho a sensação de estar,
num único dia, vivenciando coisas que, se não fosse por ti, eu
levaria toda uma vida; ou talvez uma única vida nem fosse suficiente
e então eu teria de viver tanas outras para experimentá-la.
O teu olhar, o teu sorriso, o toque sutil de tuas mãos
acariciando-me docilmente, fazem-me desejar a eternidade do presente,
o parar do relógio do tempo. Ah, se eu pudesse quebrá-lo! Ah, se eu
pudesse impedir os ponteiros de avançar! Mas isso é impossível. Um
desvario sem tamanho. Assim, só me resta guardar esses instantes na
memória, mantê-los na lembrança enquanto me for possível viver.
Eu não gosto de falar do futuro, de fazer planos. Quanto a isso,
sou mais comedido. Talvez você até estranhe esse meu comportamento,
mas é que eu prefiro não me prender ao amanhã, ao vir a ser. Ele é
tão incerto. Tão cheio de talvezes! Por isso, procuro viver o
presente da forma mais intensa possível. Horácio diz: “satisfeitos
com o presente, evitemos preocupar-nos com o futuro”. Talvez
seja esse o meu problema. Talvez eu até tema o futuro, pois nem
mesmo posso imaginá-lo sem que você não esteja nele.
Da mesma forma que não me agarro ao passado. Eu quero repousar a
minha cabeça nos teus braços toda noite, te beijando e te dizendo
“boa noite, meu amor”; quero acordar no dia seguinte com você ao
meu lado todos as manhãs da minha vida te desejando um “bom dia”;
assim como eu quero sentar à mesa contigo em todos os cafés da
manhã e em todos os momentos que nos for possível estar juntos.
Essas pequenas coisas me são tão significantes. E eu sei que você
também deseja isso tanto quanto eu. Mas “por que, em tão curta
vida, fazer tantos projetos?” Deixemos que isso ocorra
naturalmente.
Dizer-te o quanto te amo não é possível, pois não se pode ter a
medida dos seus próprios sentimentos. Posso porém afirmar-te que te
amar é o maior e mais intenso acontecimento em minha vida. Por isso,
eu lhe dedico todos os instantes; por isso o meu querer infundado em
parar o tempo; por isso essas palavras dir-se-ia quase insanas.
Eu me atenho por aqui e deixo que o silêncio de minhas palavras –
“o próprio silêncio tem a sua linguagem” como diz
Lucrécio – continuem regando o nosso amor, fixando cada vez mais
fundo as suas raízes, pois muitas vezes as palavras são
superficiais e estorvantes, tirando a beleza daquilo que apenas o
silêncio é capaz de dizer. No entanto, antes de por o ponto final,
quero que você saiba: EU TE AMO.
terça-feira, 2 de junho de 2015
ADEUS À INOCÊNCIA - CAP. 58
Durante seis dias, trabalhamos arduamente nos alicerces do que viria a ser a nossa casa. E aquele instrumento, com o qual fiz uma espécie de machado, permitiu-me cortar árvores pequenas e jovens, das quais fez-se as colunas e os caibros de sustentação do telhado. Foi a parte onde o trabalho foi mais árduo e no qual não pude contar muito com a ajuda das meninas, já que se tratava de um trabalho braçal. Enquanto isso, elas vasculharam a mata a fim de apanhar cipós para as amarras. Os poucos pregos que tínhamos não daria para muita coisa e muitos deles estavam tão velhos e enferrujados que não resistiriam às batidas. Por falar nisso, uma outra chapa de ferro foi encontrada no segundo dia, assim como um pedaço de barco no qual jaziam 4 pregos velhos e dos quais consegui aproveitar dois.
-- Num sei como a gente num encontrô eles antes – disse minha prima.
-- Porque a gente não procurou – disse Marcela. -- Eles já estavam lá quando chegamos aqui. E provavelmente devem haver mais por ai – acrescentou. -- Mais cedo ou mais tarde vamos achar mais.
-- É isso mesmo – concordou Luciana – E com isso aqui – levantou o pedaço de ferro que ela mesmo havia achado – podemos fazer uma faca de verdade.
-- Mas só depois que essa cabana estiver melhor. Por enquanto temos que nos concentrar só nisso – falei. -- Ainda temos muito trabalho por um bom tempo.
Essa conversa deu-se no segundo dia em que se iniciou a reforma da cabana.
Ao longo dos seis dias, não houve brigas, ataques de ciúmes ou coisa parecida. Nem mesmo quando a peça do biquíni improvisada acabou se rompendo, deixando Marcela nua em definitivo. Nada lembrava as semanas anteriores, onde Luciana, tomada pelo ciume, procurava me manter o tempo todo sob seu olhar. O único fato estranho nesses dias foi um mal estar repentino que a levou a rejeitar a inclusive o peixe assado. Não sabíamos o que estava se passando com ela. Nem ela mesma. Acreditávamos que talvez tivesse bebido água de coco estragada ou comido alguma fruta meio verde, a qual causara-lhe a ânsia de vômito e aquele mal estar.
-- No começo, quando a gente chegou aqui, a gente ficou assim: vomitávamos e tínhamos diarreia – falei. -- Vocês se lembram? Mas depois a gente não passou mais mal. Vai ver que é isso. Talvez tenha sido aquelas goiabas meio verdes que a gente comeu ontem – acrescentei. Graças a insistência de Luciana em me corrigir, eu já não pronunciava o “não” de forma incorreta, embora vez ou outra esse erro me escapasse.
-- Mas todos nós comemos e só ela ficou assim – disse Ana Paula.
Estávamos sentados diante da fogueira enquanto a noite se aprofundava lá fora.
-- Talvez foi porque ela ficou vários dias deitada, sem poder se mover e o organismo dela ficou fraco. Ai, as goiabas fizeram mal a ela – supus. Embora não houvesse uma explicação aparente, eu insistia na tentativa de justificar aquele mal súbito, como se inconscientemente tencionasse esconder a verdadeira causa, a qual jazia ignorada por todos nós, mas não por muito tempo.
-- Vai ver que é isso mesmo – deixou escapar Marcela. -- Mas se for, amanhã ou depois ela já vai estar melhor. A gente andou comendo goiabas demais esses últimos dias.
-- Pode ser – disse Luciana titubeante. -- O estranho é que, quando ficamos assim, também ficamos com diarreia. E agora eu estou cagando normal.
-- Isso é verdade – disse Ana Paula. -- Eu fiquei com uma caganeira danada. E era água pura. E até parecia que ao invés de cagar eu tava era mijando. -- Aquelas palavras inclusive provocaram risadas em todos nós.
Aquele estado de descontração durou por mais algum tempo, até que o sono chegou e quem não tinha de tomar conta da fogueira foi dormir, já que mais cedo ou mais tarde teria de se levantar para assumir o posto do outro e assim sucessivamente até que o dia amanhece.
Embora ainda não fosse uma casa de verdade, aquela construção era bem melhor, mais confortável e mais robusta e resistente do que a velha cabana. Não se tratava mais de um cubículo no qual mal cabia nós quatro. Faltava ainda fechar as paredes, nas quais foram usados galhos de árvores trançados e cujas extremidades eram presas aos alicerces com cipó. Mas ainda sim ficavam um buraco ou outro, já que os galhos de árvores tem por característica não serem totalmente retos. Todavia, dada as ferramentas que dispúnhamos e a nossa falta de conhecimento, a cabana, a qual decidimos chamar dali em diante de casa, ficara melhor do que se esperava. As camas ainda não estavam prontas. Apenas uma delas fora construída com o intuito de ser testada. A estrutura assemelhava-se a uma cama de verdade, embora os pés fossem fixos no chão e o estrado não passasse de finos troncos de árvore e sobre os quais, para deixá-la macia e aconchegante, ainda não tínhamos chegado a um consenso, uma vez que Luciana sugerira folhas de bananeiras, Marcela arbustos e só então as folhas de bananeiras e eu sugerira vasculhar a mata a fim de encontrar algo melhor. Assim, com o impasse, a decisão definitiva ficara para depois, para quando todas as possibilidades fossem testadas.
Por duas noites testou-se cada uma das sugestões. Por fim chegou-se a conclusão de que teríamos de procurar outra alternativa, uma vez que as folhas de bananeiras não resistiam por muitos dias e a substituição levaria inevitavelmente à escassez e ao fim das mesmas, as quais na realidade eram nossa fonte de alimentação. Aliás, foi Marcela quem nos alertou:
-- Se a gente continuar cortando as folhas, as bananeiras não vão dar mais bananas, vão morrer e a gente ter menos opção ainda. Já não temos muito o que comer nesse fim de mundo!
-- Ela está certa -- concordou Luciana, numa das raras vezes em que lhe deu razão. Embora, em muitos casos discordava dela não porque Marcela estivesse errada, mas por puro ciúme.
-- Não podemos destruir nossa fonte de alimentação. Senão a gente vai viver de quê? Peixe e goiaba? Nem disso, porque daqui uns dias as goiabas vão acabar. Elas não dão o ano inteiro – disse Marcela, que nessas horas mostrava todo o seu conhecimento. -- Eu estava até pensando: aqui tem um monte de aves. Por que a gente não mata uma de vez em quando para comer?
-- Mas matar como? -- volvi. -- Elas não deixam nem a gente chegar perto!
-- É mesmo! -- concordou Ana Paula.
-- Ora! É só a gente fazer um arco e flecha.
-- A flecha ainda dá. Mas como a gente vai fazer um arco? A gente não tem corda – insisti.
-- É só usar um cipó.
Como isso não nos ocorrera ainda? Era uma coisa tão simples. Quando nos ocorreu de usar uma lança para pegar peixes, essa mesma sugestão poderia nos ter levado ao arco e a flecha, mas isso nos escapou. Talvez o fato de estarmos preocupados demais com os nossos próprios interesses levou-nos a negligenciar o coletivo. E agora que as brigas, as intrigas, as explosões de ciúmes e até mesmo instinto sexual amenizaram-se houve espaço para que as ideias e as sugestões de interesse coletivo viessem à tona.
--Não vai ser nada fácil aprender a acertar esses bichos. Eles são muito rápidos – afirmou Luciana. -- Aposto como vai ser mais difícil do que usar aquela lança para acertar os peixes.
-- Talvez não. É só a gente esperar ele pousar. Ai fica mais fácil – explicou Marcela.
-- Eu também vou querer aprender a usar a flecha – disse minha prima.
-- Eu também – exclamou Marcela. -- Você que é homem, aprende primeiro e depois ensina pra gente – acrescentou, dirigindo-se a mim.
Luciana fitou-me com um olhar enfezado. No entanto, não esperei que ela abrisse a boca e desse início a uma discussão.
-- A gente faz um arco e flecha para cada um e aprendemos todos juntos. Assim fica até mas fácil de acertar um desses pássaros. Vocês não acham? -- Era um truque que eu vinha usando ultimamente para evitar que a harmonia se desfizesse. Sabia que isso muito provavelmente não perduraria, mas eu não tinha alternativas.
Luciana acalmou-se e a tensão desanuviou-se de sua face. Isso me deu um alívio, porque cheguei a pensar que a paz e a harmonia, a qual vinha durando uma semana, tinham terminado.
-- E quando a gente vai fazer nosso arco e flecha? -- quis saber Ana Paula.
-- Amanhã a gente vai procurar o tipo de árvore ideal. Não pode ser qualquer uma porque senão ela quebra quando for envergada – disse Marcela. -- A gente pode ir depois de acordar. Que tal?
-- Já que você deu a ideia e entende tanto assim do assunto, vai com a Ana Paula e eu fico com Sílvio pescando. Quero que ele tente novamente a me ensinar a pescar. Da outra vez não tive paciência, mas agora prometo que vou ter – disse Luciana com humor. -- Meu pé já melhorou e agora posso firmar ele no chão. Só dói de vez em quando, quando eu piso com mais força. Mas já consigo firmar ele. Você vai ter paciência, não vai? -- perguntou Luciana de uma forma que parecia mais uma ordem do que uma pergunta.
-- Vou sim.
-- Eu também quero aprender – declarou Ana Paula.
-- Depois ele te ensina. Primeiro vai ser eu – interveio Luciana.
Vi naquele arranjo uma forma de afastar as duas para longe a fim de que ele pudesse ficar as sós comigo. Contudo, eu não tinha saída. Se sugerisse outra coisa e a contrariasse, provavelmente se revoltaria e acabaria descontando em todo mundo, como ela fizera antes. E certamente eu tornaria a viver um inferno em suas mãos.
-- É meninas. Luciana tem razão. E eu também não gosto de entrar nessa mata enquanto vocês duas parecem que adoram. Eu também não sei que tipo de coisa serve prum arco e flecha. Nunca vi uma na minha vida. Só nos livros e na TV. E a gente também precisa comer. E quem sabe pescar além de mim? Ninguém. Só eu. Então? Eu vô pescar, aproveito para ensinar Luciana, e vocês fazem a parte de vocês – falei.
-- Combinado – disse Ana Paula. -- Mas carne de pássaro tem o mesmo gosto que carne de frango? -- perguntou ela por fim.
-- Sei lá – respondi.
-- Não deve ser muito diferente. Afinal ambas são aves – afirmou Marcela.
-- E que diferença faz? Desde que mate a nossa fome – interveio Luciana.
A conversa prolongou até que a noite caiu e então cada um foi procurar o seu canto. Menos Marcela que precisava tomar conta da fogueira, embora já não se via tanta necessidade disso, uma vez que se podia cortar tronco de árvores, os quais mantinham a fogueira acesa por mais tempo. Antes de pregar os olhos porém, não pude deixar de pensar nela. Ela estava sentada diante da fogueira, tão próxima – eu podia ver seu corpo nu por causa da luz da fogueira -- e entretanto não podia nem mesmo ficar contemplando-a, ainda mais agora que estava toda nua. Vez ou outra eu até fazia, mas de forma que Luciana não percebesse, pois sabia que se esta visse, seria tomada pela desrazão, talvez a reação mais natural nas pessoas possessivas e escravas do ciúme, e fizesse alguma besteira.
Mas se Luciana podia controlar meus olhares, não tinha poder algum sobre meus pensamentos. Então imaginei Marcela e eu correndo para o outro lado da ilha e se deitando na arei, rolando um por cima do outro e se entregando aos beijos, às carícias e finalmente unindo nossos corpos. Via meu corpo deslizando sobre o dela feito as ondas do mar que deslizam sobre a areia naquele ir e vir interminável. Ah, como essa imagem me deleitou! Deixei por várias vezes escapar um sorriso, o qual era ocultado pelo braço, uma vez que Luciana poderia virar-se em minha direção e surpreender-me naquela felicidade. E foi assim que adormeci.
-- Num sei como a gente num encontrô eles antes – disse minha prima.
-- Porque a gente não procurou – disse Marcela. -- Eles já estavam lá quando chegamos aqui. E provavelmente devem haver mais por ai – acrescentou. -- Mais cedo ou mais tarde vamos achar mais.
-- É isso mesmo – concordou Luciana – E com isso aqui – levantou o pedaço de ferro que ela mesmo havia achado – podemos fazer uma faca de verdade.
-- Mas só depois que essa cabana estiver melhor. Por enquanto temos que nos concentrar só nisso – falei. -- Ainda temos muito trabalho por um bom tempo.
Essa conversa deu-se no segundo dia em que se iniciou a reforma da cabana.
Ao longo dos seis dias, não houve brigas, ataques de ciúmes ou coisa parecida. Nem mesmo quando a peça do biquíni improvisada acabou se rompendo, deixando Marcela nua em definitivo. Nada lembrava as semanas anteriores, onde Luciana, tomada pelo ciume, procurava me manter o tempo todo sob seu olhar. O único fato estranho nesses dias foi um mal estar repentino que a levou a rejeitar a inclusive o peixe assado. Não sabíamos o que estava se passando com ela. Nem ela mesma. Acreditávamos que talvez tivesse bebido água de coco estragada ou comido alguma fruta meio verde, a qual causara-lhe a ânsia de vômito e aquele mal estar.
-- No começo, quando a gente chegou aqui, a gente ficou assim: vomitávamos e tínhamos diarreia – falei. -- Vocês se lembram? Mas depois a gente não passou mais mal. Vai ver que é isso. Talvez tenha sido aquelas goiabas meio verdes que a gente comeu ontem – acrescentei. Graças a insistência de Luciana em me corrigir, eu já não pronunciava o “não” de forma incorreta, embora vez ou outra esse erro me escapasse.
-- Mas todos nós comemos e só ela ficou assim – disse Ana Paula.
Estávamos sentados diante da fogueira enquanto a noite se aprofundava lá fora.
-- Talvez foi porque ela ficou vários dias deitada, sem poder se mover e o organismo dela ficou fraco. Ai, as goiabas fizeram mal a ela – supus. Embora não houvesse uma explicação aparente, eu insistia na tentativa de justificar aquele mal súbito, como se inconscientemente tencionasse esconder a verdadeira causa, a qual jazia ignorada por todos nós, mas não por muito tempo.
-- Vai ver que é isso mesmo – deixou escapar Marcela. -- Mas se for, amanhã ou depois ela já vai estar melhor. A gente andou comendo goiabas demais esses últimos dias.
-- Pode ser – disse Luciana titubeante. -- O estranho é que, quando ficamos assim, também ficamos com diarreia. E agora eu estou cagando normal.
-- Isso é verdade – disse Ana Paula. -- Eu fiquei com uma caganeira danada. E era água pura. E até parecia que ao invés de cagar eu tava era mijando. -- Aquelas palavras inclusive provocaram risadas em todos nós.
Aquele estado de descontração durou por mais algum tempo, até que o sono chegou e quem não tinha de tomar conta da fogueira foi dormir, já que mais cedo ou mais tarde teria de se levantar para assumir o posto do outro e assim sucessivamente até que o dia amanhece.
Embora ainda não fosse uma casa de verdade, aquela construção era bem melhor, mais confortável e mais robusta e resistente do que a velha cabana. Não se tratava mais de um cubículo no qual mal cabia nós quatro. Faltava ainda fechar as paredes, nas quais foram usados galhos de árvores trançados e cujas extremidades eram presas aos alicerces com cipó. Mas ainda sim ficavam um buraco ou outro, já que os galhos de árvores tem por característica não serem totalmente retos. Todavia, dada as ferramentas que dispúnhamos e a nossa falta de conhecimento, a cabana, a qual decidimos chamar dali em diante de casa, ficara melhor do que se esperava. As camas ainda não estavam prontas. Apenas uma delas fora construída com o intuito de ser testada. A estrutura assemelhava-se a uma cama de verdade, embora os pés fossem fixos no chão e o estrado não passasse de finos troncos de árvore e sobre os quais, para deixá-la macia e aconchegante, ainda não tínhamos chegado a um consenso, uma vez que Luciana sugerira folhas de bananeiras, Marcela arbustos e só então as folhas de bananeiras e eu sugerira vasculhar a mata a fim de encontrar algo melhor. Assim, com o impasse, a decisão definitiva ficara para depois, para quando todas as possibilidades fossem testadas.
Por duas noites testou-se cada uma das sugestões. Por fim chegou-se a conclusão de que teríamos de procurar outra alternativa, uma vez que as folhas de bananeiras não resistiam por muitos dias e a substituição levaria inevitavelmente à escassez e ao fim das mesmas, as quais na realidade eram nossa fonte de alimentação. Aliás, foi Marcela quem nos alertou:
-- Se a gente continuar cortando as folhas, as bananeiras não vão dar mais bananas, vão morrer e a gente ter menos opção ainda. Já não temos muito o que comer nesse fim de mundo!
-- Ela está certa -- concordou Luciana, numa das raras vezes em que lhe deu razão. Embora, em muitos casos discordava dela não porque Marcela estivesse errada, mas por puro ciúme.
-- Não podemos destruir nossa fonte de alimentação. Senão a gente vai viver de quê? Peixe e goiaba? Nem disso, porque daqui uns dias as goiabas vão acabar. Elas não dão o ano inteiro – disse Marcela, que nessas horas mostrava todo o seu conhecimento. -- Eu estava até pensando: aqui tem um monte de aves. Por que a gente não mata uma de vez em quando para comer?
-- Mas matar como? -- volvi. -- Elas não deixam nem a gente chegar perto!
-- É mesmo! -- concordou Ana Paula.
-- Ora! É só a gente fazer um arco e flecha.
-- A flecha ainda dá. Mas como a gente vai fazer um arco? A gente não tem corda – insisti.
-- É só usar um cipó.
Como isso não nos ocorrera ainda? Era uma coisa tão simples. Quando nos ocorreu de usar uma lança para pegar peixes, essa mesma sugestão poderia nos ter levado ao arco e a flecha, mas isso nos escapou. Talvez o fato de estarmos preocupados demais com os nossos próprios interesses levou-nos a negligenciar o coletivo. E agora que as brigas, as intrigas, as explosões de ciúmes e até mesmo instinto sexual amenizaram-se houve espaço para que as ideias e as sugestões de interesse coletivo viessem à tona.
--Não vai ser nada fácil aprender a acertar esses bichos. Eles são muito rápidos – afirmou Luciana. -- Aposto como vai ser mais difícil do que usar aquela lança para acertar os peixes.
-- Talvez não. É só a gente esperar ele pousar. Ai fica mais fácil – explicou Marcela.
-- Eu também vou querer aprender a usar a flecha – disse minha prima.
-- Eu também – exclamou Marcela. -- Você que é homem, aprende primeiro e depois ensina pra gente – acrescentou, dirigindo-se a mim.
Luciana fitou-me com um olhar enfezado. No entanto, não esperei que ela abrisse a boca e desse início a uma discussão.
-- A gente faz um arco e flecha para cada um e aprendemos todos juntos. Assim fica até mas fácil de acertar um desses pássaros. Vocês não acham? -- Era um truque que eu vinha usando ultimamente para evitar que a harmonia se desfizesse. Sabia que isso muito provavelmente não perduraria, mas eu não tinha alternativas.
Luciana acalmou-se e a tensão desanuviou-se de sua face. Isso me deu um alívio, porque cheguei a pensar que a paz e a harmonia, a qual vinha durando uma semana, tinham terminado.
-- E quando a gente vai fazer nosso arco e flecha? -- quis saber Ana Paula.
-- Amanhã a gente vai procurar o tipo de árvore ideal. Não pode ser qualquer uma porque senão ela quebra quando for envergada – disse Marcela. -- A gente pode ir depois de acordar. Que tal?
-- Já que você deu a ideia e entende tanto assim do assunto, vai com a Ana Paula e eu fico com Sílvio pescando. Quero que ele tente novamente a me ensinar a pescar. Da outra vez não tive paciência, mas agora prometo que vou ter – disse Luciana com humor. -- Meu pé já melhorou e agora posso firmar ele no chão. Só dói de vez em quando, quando eu piso com mais força. Mas já consigo firmar ele. Você vai ter paciência, não vai? -- perguntou Luciana de uma forma que parecia mais uma ordem do que uma pergunta.
-- Vou sim.
-- Eu também quero aprender – declarou Ana Paula.
-- Depois ele te ensina. Primeiro vai ser eu – interveio Luciana.
Vi naquele arranjo uma forma de afastar as duas para longe a fim de que ele pudesse ficar as sós comigo. Contudo, eu não tinha saída. Se sugerisse outra coisa e a contrariasse, provavelmente se revoltaria e acabaria descontando em todo mundo, como ela fizera antes. E certamente eu tornaria a viver um inferno em suas mãos.
-- É meninas. Luciana tem razão. E eu também não gosto de entrar nessa mata enquanto vocês duas parecem que adoram. Eu também não sei que tipo de coisa serve prum arco e flecha. Nunca vi uma na minha vida. Só nos livros e na TV. E a gente também precisa comer. E quem sabe pescar além de mim? Ninguém. Só eu. Então? Eu vô pescar, aproveito para ensinar Luciana, e vocês fazem a parte de vocês – falei.
-- Combinado – disse Ana Paula. -- Mas carne de pássaro tem o mesmo gosto que carne de frango? -- perguntou ela por fim.
-- Sei lá – respondi.
-- Não deve ser muito diferente. Afinal ambas são aves – afirmou Marcela.
-- E que diferença faz? Desde que mate a nossa fome – interveio Luciana.
A conversa prolongou até que a noite caiu e então cada um foi procurar o seu canto. Menos Marcela que precisava tomar conta da fogueira, embora já não se via tanta necessidade disso, uma vez que se podia cortar tronco de árvores, os quais mantinham a fogueira acesa por mais tempo. Antes de pregar os olhos porém, não pude deixar de pensar nela. Ela estava sentada diante da fogueira, tão próxima – eu podia ver seu corpo nu por causa da luz da fogueira -- e entretanto não podia nem mesmo ficar contemplando-a, ainda mais agora que estava toda nua. Vez ou outra eu até fazia, mas de forma que Luciana não percebesse, pois sabia que se esta visse, seria tomada pela desrazão, talvez a reação mais natural nas pessoas possessivas e escravas do ciúme, e fizesse alguma besteira.
Mas se Luciana podia controlar meus olhares, não tinha poder algum sobre meus pensamentos. Então imaginei Marcela e eu correndo para o outro lado da ilha e se deitando na arei, rolando um por cima do outro e se entregando aos beijos, às carícias e finalmente unindo nossos corpos. Via meu corpo deslizando sobre o dela feito as ondas do mar que deslizam sobre a areia naquele ir e vir interminável. Ah, como essa imagem me deleitou! Deixei por várias vezes escapar um sorriso, o qual era ocultado pelo braço, uma vez que Luciana poderia virar-se em minha direção e surpreender-me naquela felicidade. E foi assim que adormeci.
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